– Bom dia Grande Sábio!
– Insisto que não voltes a chamar-me sábio. Tu és mais sábio do que eu.
– Muito bem. Chamá-lo-ei Mestre, como sempre. Foi apenas um deslize de linguagem.
– Sabes bem que é muito importante ter cuidado com o que se diz. As palavras que dizes são dardos. Devem ser preparados e disparados conscientemente, senão será o mesmo que atirar um dardo para o ar de olhos fechados. Podes acertar no local errado.
– Mas qual é o erro em chamar sábio a alguém que é obviamente um poço de sabedoria?
– Um mestre é alguém que orienta outro no seu caminho. Um mestre pode ser bastante inculto e até desprovido de qualquer educação. Um mestre, que é o que sou, tem como característica principal a preocupação para com o caminho do seu pupilo. O que o torna mestre não são as suas qualidades para executar o que quer transmitir, mas sim a capacidade para transmiti-lo. Apesar de no meu caso usar muitas vezes o meu próprio exemplo, há muitas áreas em que és muito superior a mim.
– Mestre, não me parece…
– Sabes bem o que penso da modéstia, não sabes?
– É falsa, sim sei. Concordo consigo, perdão…
– Ainda assim sou um Mestre, talvez não tão dotado como Mohandas, mas um bom mestre.
– De facto…
– Quanto a sábio, ainda tenho muito que trabalhar.
– Porquê?
– Um sábio é, como o próprio nome indica (pelo menos na língua em que falo) uma “pessoa que sabe”. Muitas vezes os sábios são confundidos com mestres, porque são quase sempre bons líderes, mas a maior parte das vezes terão muitos anos antes de poder ser mestres. Os sábios, não possuem necessariamente uma grande quantidade de conhecimentos, no entanto conseguem intuir com facilidade acerca de coisas novas. Conseguem chegar ao resultado de uma equação sem saber resolvê-la.
– Hum… interessante…
– Estás a reconhecer-te?
– Em parte…
– Apesar de isto parecer excelente à primeira vista, tem também alguns problemas associados. Um sábio não é um bom mestre porque não sabe explicar o que sabe. Os visionários são normalmente sábios com dificuldades de expressão. De certo modo o que os faz visionários é o facto de não conseguirem que os que os rodeam os acompanhem. Um sábio que saiba explicar o caminho, passa a ser um pioneiro, porque leva os seus no caminho que percorre.
– Tenho que meditar sobre isso.
– Pois tens.
– E portanto eu sou um sábio?
– Exactamente, mas deves tirar da palavra toda a carga solene que lhe dão na tua linguagem. Ser sábio é como ser grande ou pequeno. Não é bom ou mau em si mesmo, é apenas uma característica. Claro que isto não é o que queres ser.
– Pois, nunca queremos o que temos.
– Claro, isso seria não querer nada. Eu, por exemplo, quando tinha a tua idade queria ser sábio, porque sempre fui mestre, desde muito pequeno que sei “encaminhar os outros”, mas sempre invejei os “oráculos” que sabem coisas que os outros não sabem. Eventualmente acabei por descobrir que a felicidade nada tem a haver com isto e agora apenas procuro a bondade, mas isso é outro assunto…
– Já tenho muito em que pensar
– E que practicar. Podes começar por guardar esta conversa em escrito.
– Ah, foi por isso que me disse para gravar!
– Agora deves transcrever para papel, traduzindo para a tua língua, e depois apagar a gravação.
– Fá-lo-ei. Gostava também de publicar partes da conversa de hoje…
– Pelo que me mostraste, sempre que publicas algo que eu disse, fá-lo de uma forma a que pareço demasiado sábio. Pode ser uma percepção dada pela tradução, mas de qualquer modo digo-te que esta conversa pode ser publicada, mas integralmente.
– Assim? Não parecerá um pouco mundana?
– Sim, de certeza que sim.
Gostar disto:
Gosto Carregando...