Hoje não tenho nada para te dizer Maria.
Não tenho. nem palavras doces, nem frases ríspidas
Hoje é um dia, não dia um
hoje não começa nada, mas amanhã terá pelo menos acabado hoje.
hoje que não tem futuro
Hoje estou desinfeliz e satisfeito de esperança
não quero nada, mas tenho tudo o que quero
Ter tudo! Será a felicidade suprema?
Não sei. Hoje de manhã provei-me e o meu sangue sabia a sangue
não sabia a mar, como os cabelos de uma menina feliz que li num romance, não cheirava a morte como os condenados que estavam presos nas páginas de outro livro. Lambi-me a pele e sabia a sal, como seria de esperar.
Nada de especial.
Um rabino disse que é uma grande benção chegar a um estado de “total acalmia”.
Esperei horas debaixo da sombra de um carvalho, mas no final a grande revelação que tive foi sede e queimaduras solares.
O psiquiatra usou exactamente os mesmo argumentos. Os comprimidos dar-me-iam ânimo e vitalidade, mas tenho um vizinho que usa heroína à anos e não me parece mais feliz do que eu.
não te sirvo para nada Maria, nem tu a mim.
mas és o meu único querer,
e mesmo sem ser infeliz,
és todos os meus momentos de felicidade