O profeta está ofendido.
No topo da montanha onde dorme há muitas centenas de anos, manda raios e coriscos que não acertam em lado nenhum.
Dali todos lhe parecem estúpidos. E os que não são estúpidos, são perversos ou vegetativos.
Os fortes mandam, como sempre, mas mandam sem pudor, sem moral e sobretudo sem medo. Nada de mal pode acontecer aos fortes, deixou de se contar como o heróico David tombou o invencível Golias. Já ninguém se lembra que bastou uma lâmina para Sansão ser o mais comum dos homens. Parece não haver razão para nada.
Impotente olha para o céu, onde O que manda não se deixa ver. Os que passeiam desenvergonhados no sopé da montanha dizem que Deus é grande, mas quase todos duvidam que sequer exista.
Outros há que dizem que Deus é infinito, mas é mais finita a fé do que o egotismo.
O profeta sabe que há dois tipos de homem: os que acreditam em Deus quando são tomados pelo desespero e os que deixam de acreditar em Deus quando o mesmo desespero chega, há ainda os que sabem Deus, que O sentem, mas esses são tão raros que nem contam.
O tempo do profeta já passou e não voltará nunca mais, porque ao contrário do que dizem os sábios, a história nunca se repete, é sempre diferente e não é evitando os erros do passado que se prepara o futuro. O futuro prepara-se com treino, bondade e o treino da bondade.
O profeta sabe que deve ser bom e condescendente, mas tivera ele o poder destruidor dos ventos ou das marés e teria arrancado pela raíz esses ervas daninhas que o usam para se acharem superiores. Aos que se acham superiores ao próprio profeta, apatanhá-los-ia só para saberem que não passam de um grão de pó agarrado a um sapato velho, aos que acham que o profeta é mais iluminado do que o Sol, esbofeteá-los-ia para verem como é tão vingativo e rancoroso como qualquer outro.